16.10.07

A água tinha um gosto sujo naquelas montanhas. Todos os leitos mortos de rios que um dia foram força e fluxo, aparentemente indestrutíveis, como é de praxe na aparência de rios todavia sanos, naquele altura, só dispunham de uns míseros filetes de água turva que desciam com sofreguidão por entre as rochas coloridas e plantas moribundas típicas do deserto andino. Ouvia o som das flautas e samponhas misturando-se ao vento frio e seco dos andes, além desses, também os sons da areia esmagada pelas solas das minhas botas e dos índios sussurrando seus diálogos incompreensíveis numa mescla estranha de Aymará e Castellano. E então, somente depois de entrar por entre os confins da loucura, absorvendo dia após dia o cheiro podre de suas vidas mortas, somente depois de clavar adentro aos delírios da catárse auditiva de suas histórias e habitat, e (principalmente), depois de embebedar-me na letargia anestésica de suas folhas e cactus medicinais, só de aí em diante pude esclarecer a idéia de que somos um só.